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"Aceitar-me plenamente? É uma violentação de minha vida. Cada mudança, cada projeto novo causa espanto: meu coração está espantado. É por isso que toda minha palavra tem um coração onde circula sangue" (Um sopro de vida - Clarice Lispector)

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013



"Olha, perdoe esse meu cansaço, esse meu suor. Corri tanto, tanto... Desfaleci. Hoje o desafeto demorou um pouco mais na cozinha. Cortei os legumes com tanta pressa que quase aprontei com os dedos (com os medos, quem me dera). Fiquei aflita com esse texto se aninhando em minha mente enquanto eu estava lá absorta, com um suspiro preocupado que nunca soube repousar. Hoje sou só algumas mãos arredias cuidando dos tomates, esmiuçando os pensamentos. Hoje pra mim ainda é ontem. O amanhã cansou de chegar. Estou levemente desamparada, esvoaçada, ouvindo a mesma música. (O mar dessa canção me (co)move, me sensibiliza). Mas estou incomodada ainda, observando. Arrumei a casa de um jeito tão negligente que suspeito estar assim por dentro: do avesso. Poeira maior deixo sobre a mesa — de centro. Centro do meu mundo, do meu tudo, ventre desarrumado. Ainda não pude desincrustar a alma com alguma alegria. Logo cedo recebi visitas, preciso esperar a hora dos choros. A dor precisa de espaço para se repetir e morar, e logo depois sair imune, dissolvida. Por um momento sinto-me bem. Poesia salva, sabia? Uma salvação repentina que me diminui pra ficar maior... Quase não consigo contê-la nesse trecho. Pretendo esperar o próximo parágrafo enquanto dou um jeito nesta cama. Quase agora um Amor antigo questionou o meu silêncio e adicionou, cheio de medo: “Entendo, tem dias que a gente não está pra ninguém, não é?”, fiquei um pouco mais triste por envolvê-lo nesse meu cansaço (tão antigo, tão pequeno) e respondi, cheia de dedos: “Se quiser, você pode não estar pra mim hoje também. Vou gostar de você do mesmo jeito, talvez, de um jeito um pouco maior”. E ele me enviou um sorriso tão teimoso, desentendido e bonito que eu desisti — Meu Deus, eu desisti!! — da amargura do meu próximo desalento. Poesia salva, sabia? Poesia salva..."

(Priscila Rôde - via Facebook)